História
de Pai José de Angola
Em
uma prosa informal, Pai José contou sua história com simplicidade, bem típica
dele. Aqui está à história deste Preto Velho tão querido, transcrita por mim da
maneira mais fiel possível para que todos possam compreender...
Em
Angola por volta de 1640 nasceu o Pai
Jose de Angola,. Em sua cidade natal foi escravizado por volta dos seus 30 anos
de idade e trazido ao Brasil nos chamados ‘Navios Negreiros’.
Nesta
longa viajem viu muitos amigos e conhecidos morrerem por doenças ou fraquezas e
serem lançados ao mar, mas sua fé nos Orixás era o que o fortalecia. Ao chegar
ao Brasil, percebeu que a língua falada aqui era a mesma de sua cidade, o
português.
Como
era um negro muito sadio e forte, com dentes brancos e bons, foi vendido como
escravo para ser um ‘reprodutor’, pois naquela época pensavam que os negros não
tinham amor, não tinham sentimentos. E assim foi trabalhar na colheita de café e
cana de açúcar em uma fazenda.
Na
senzala encontrou uma linda escrava, Maria Conga, pela qual se apaixonou. Seu
romance foi complicado, pois ela trabalhava na casa principal da fazenda,
acompanhante da sinhazinha, filha do coronel da fazenda.
Entre
o trabalho escravo nas colheitas e ser um escravo reprodutor, teve filhos
incontáveis na senzala, alguns permaneceram ao passar dos anos na mesma
fazenda, outros morreram ou foram vendidos.
Como
sempre foi um escravo que não se conformava com a situação da escravidão porque
não se conformava em viver como um animal tentou realizar várias revoluções,
mas mudar a cabeça e o pensamento das pessoas sempre foi muito difícil, não
tendo sucesso em seus movimentos, ficou marcado pelos capitães do mato e pelo
coronel da fazenda onde era escravo.
Os
escravos que estavam fracos ou doentes e que tentavam fugir eram lhes dado
melancia e leite, o que supostamente faria mal aos escravos e morreriam, mas na
verdade era somente uma desculpa para serem mortos pelos capitães do mato.
Mesmo
quando alguns escravos conseguiram a Carta de Alforria, Pai José com
aproximadamente 70 anos ainda tentou fazer mais uma revolução com filhos e
outros negros da fazenda. Desta vez os escravos conseguiram fugir, indo à
direção ao tão falado Quilombo de Palmares. Porém, já com a idade avançada não
tinha o mesmo pique dos seus filhos que ainda o acompanhavam e os escravos que
participaram desta fuga. Em muitos momentos o carregaram para que conseguisse
acompanhar a fuga.
Enquanto
isso os capitães do mato os perseguiam com cachorros e a cavalo para a captura
dos escravos fugitivos, já que os Coronéis para manter sua fama e “estatus” não
podiam deixar que qualquer escravo fugisse e/ou escapasse vivo destes feitos.
Pai
José pediu aos seus companheiros para seguirem em frente e o deixarem para
trás, pois só atrasaria os outros escravos, que seriam capturados e castigados.
Esconde-se no meio de algumas pedras (buraco) através de uma fenda. Seu azar
foi que tinha pouco tempo e ali também estava escondido um gato. Pai José
contou que os escravos naquela época costumavam enganar o faro dos cachorros
colocando cinzas em sua volta para enganar o cheiro, mas devido aos fatos, os
cachorros acabaram seguindo o gato e seu verdadeiro faro, capturando o escravo
na fenda em meio às pedras. Pai José descobriu mais tarde que um escravo
capturado havia denunciado seu trajeto de fuga, provavelmente em troca de sua
vida. (Pai José não demonstrou rancor ao relatar este fato e nem citou o nome
do escravo)
Na
fazenda os feitores como castigo, amarraram-no em uma pedra por sete dias e
sete noites ao tempo. Seu castigo pela fuga e por acharem que ele era o
principal incentivador da revolução e fuga foi
muito severo, cortaram pedaços de seu corpo, como dois dedos das mãos e recebeu
muitas chibatadas, ficou sem nada para comer ou beber. Os feitores tinham a
intenção que o escravo contasse onde estavam escondidos os outros escravos
fugitivos. Mesmo com a severa punição, o Preto Velho não desistiu de sua vida
nem dedurou os outros escravos, principalmente pela fé em Oxalá, na natureza e
pela ajuda de Maria Conga, sua companheira, que nas madrugadas levava para seu
querido preto uma ‘canja aguada’ com restos de comida que conseguia na fazenda.
Como
os feitores tinham certeza que o escravo era o revolucionário que havia
comandado a fuga, com a ordem do ‘sinhozinho’ Pai José foi liberto, para morrer
ou com a intenção de que os outros escravos fugitivos o encontrassem, acabando
com a fuga e a revolução. Naquela época os feitores precisavam capturar todos
os escravos fugitivos vivos ou mortos para mostrar a sociedade e continuar com
sua força, fama, liderança e com suas fazendas. Após os escravos fugitivos
serem capturados e muitas vezes mortos, seus corpos eram expostos à sociedade e
em seguida jogados no manto.
Pai
José muito debilitado pelo massacre em seu corpo e pela franqueza, saiu por
trás de uma casa muito antiga e em uma emboscada encontrou uma cumbuca cheia de
bolachas (ele descreveu-as como as nossas atuais bolachas de natal), como a
fome estava grande, não pensou e as comeu, e cada vez que comia mais uma
bolacha queria comer mais, chegou a comer toda a cumbuca (as bolachas estavam
envenenadas) e em seguida foi se sentindo muito mal, com dores fortes no peito
até que sua respiração parou, findando assim a vida terrena do escravo Pai José
de Angola.
No
final de nossa prosa, Pai José falou sobre seu nome, disse que naquele tempo
não havia nomes diferentes como os de hoje em dia e sim muitos Antônios, Josés
e Marias; assim existiam vários escravos com o mesmo nome e o seu é Pai José de
Angola.
Disse
finalizando e com pressa de “ir embora” que se no passado não existissem os
escravos, não teríamos hoje a nossa religião Umbanda.
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